quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

RAPUNZEL, PETROSINELLA E PERSINETTE

Durante as nossas aulas sobre as origens da literatura infantil temos visto o quão é difícil datar e circunscrever o lugar e o tempo em que as narrativas populares "nascem", porque elas, em razão da oralidade, fazem parte do imaginário das pessoas de diferentes regiões, antes das nações-estados demarcarem as terras geopolíticamente e partissem em busca do acervo cultural do seu território, ou pelo menos reivindicado como seu, no qual se incluia a literatura, tendo como fonte as histórias narradas na língua vernácula.
Rapunzel é uma dessas histórias populares cuja palavra significa alface de cordeiro, um tipo de alface com folhas miúdas, mas que no conto é dado à filha porque a sua mãe desejava muito comer alfaces quando grávida. A história de Rapunzel não “nasce” com os Whillem e Jacob Grimm, mas ela circula no imaginário popular um século antes dos dois irmãos alemães contarem a sua versão. Na Itália, em 1637, Giambattista Basile escreveu Petrosinella nome derivado de “petrosine” de “parsley” que significa salsa, uma hortaliça.
Em 1697, Charlotte Rose de Caumont de la Force, uma aristocrata francesa, escreveu Persinette uma versão muito parecida com Rapunzel e Petrosinella, mostrando que as narrativas orais eram contadas e recontadas e que neste processo elas iam sofrendo alterações. Persinette foi traduzido para o alemão várias vezes, sendo que em uma das versões, a deJ. C. F. Schulz, ocorreu a troca do nome Persinette por Rapunzel, considerado assim o texto-base sobre o qual os Grimm escreveram a sua versão.
São visíveis as aproximações entre as narrativas. No conto de Basile, por exemplo, não há a presença do marido, mas apenas da esposa grávida que pula a janela para roubar as salsas e uma ogra (traduzida em outras versões como feiticeira, bruxa, madrasta) que cultiva as hortaliças.
Com tudo isso, vemos o quão é inútil buscar por uma origem, na medida em que a sua importância só é vista em um contexto histórico a partir da modernidade, quando as nações vão se preocupar com a unidade interna e irão precisar mapear as produções culturais do povo a fim de uni-lo dentro de um corpo sociocultural e geopolítico, elegendo símbolos que possam gerar nos membros de uma comunidade imaginada, para citar Benedict Anderson, o sentido de pertencimento, identidade e unidade.
Essas referências intertextuais mostram a riqueza cultural planetária com um imaginário comum, mas fragmentado em nome do poder, da cobiça, dos desejos de dominação. Não podemos assegurar que os contos de fada pertencem a determinado país, na medida em que vários países trazem em seu acervo literário o mesmo conto com pequenas alterações. No máximo podemos falar em versões.

3 comentários:

  1. Sem esquecer que a origem pode estar na história de Santa Bárbara (início da era cristã) rs

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  2. Ou a lenda da moça de Shalott, ou Elaine de Astolat.

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