Li recentemente dois livros de Palmira Heine, escritora baiana de literatura infantojuvenil. O livro Uma amizade no mundo dos números e O reino todo amarelo, este em sua 2ª edição, foram publicados neste ano pela Editora Garcia, de Minas Gerais.
Uma amizade no mundo dos números narra a história de amizade e, também, de visão da
realidade. O livro aborda a solidão como escolha e não um fim em
si mesmo. Estar sozinho pode ser uma opção e o número 1, depois que descobriu o
número 0, percebeu que estar só ou acompanhando era uma questão de opção. Era só
se mexer que o mundo se apresentava diferente. O número 1 poderia ser 1 ou 10
quando ele quisesse. Esta ideia de que devemos nos movimentar fisicamente ou
mentalmente para que a realidade se altere é um princípio filosófico importante
porque mostra que a dinâmica da vida, a maneira de como o sujeito se vê e vê o
outro depende de uma mudança de lugar, de visão.
Do ponto de vista
pedagógico, trazer outros conhecimentos para a literatura é uma forma de
aproximar a criança do seu universo complexo que em momento algum é
compartimentalizado como as disciplinas escolares. Neste livro de
Palmira Heine, a matemática aparece de forma lúdica e filosófica e a literatura
de forma criativa e brincante.
Já o livro O reino todo amarelo nos fala de algo
sério e muito atual, mas que a escrita de Heine coloca de forma leve e criativa:
o poder das instituições. As feministas sempre questionaram o discurso mandante
do patriarcado, em geral personificado na figura masculina – o rei, o chefe, o
pai, o marido – e neste livro é possível ler desta forma, já que temos um rei
que impõe uma forma de ser e ver o mundo a partir do seu gosto e vontade. Ele
ignora os outros gostos e vontades, por isso sequer olha a infelicidade das
pessoas a sua volta, até porque ele nem as enxerga como pessoas. Um dia uma
fada resolve criar uma semente mágica e dela nasce uma flor com pétalas multicores
que faz o rei se desesperar. A flor se multiplica e acaba fazendo o rei abdicar
do seu trono e ir embora.
Do ponto de vista pedagógico,
é uma leitura oportuna, já que na fase infantil há que se ensinar a criança a
não ser autoritária, mas estimulá-la a ser cortês, a escutar,
a pensar que a sua vontade é tão importante quanto às demais.
Do ponto de vista
literário, o texto dialoga com outras narrativas de fadas, tão conhecidas pelas
crianças. É uma forma de mostrar, a partir de um texto encantador, como é
possível mudar a realidade do leitor, fazendo uso de elementos do universo literário:
rei, fada, encanto, castelo, jardins.
Com esses dois livros, a
literatura baiana infantojuvenil amplia o seu acervo e mostra como é possível associar as várias funções da literatura, principalmente a literatura escrita para crianças.
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*Lúcia Leiro é crítica literária, pesquisadora e professora de literatura brasileira da Universidade do Estado da Bahia.
O trabalho A literatura infantojuvenil de Palmira Heine de Lúcia Tavares Leiro está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-SemDerivações 4.0 Internacional.
Baseado no trabalho disponível em https://literaturaeeducacao-uneb.blogspot.com.br/2017/08/interseccionalidades-e-diversidade-na.html.
Podem estar disponíveis autorizações adicionais às concedidas no âmbito desta licença em https://www.facebook.com/ltleiro.
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